não sei como te explicar que o amor, dentro de mim, te procura
não sei como renuncias à tão descomunal forma como te olho e te reproduzo no vácuo que me angustia e me oprime a azáfama vontade de ser
não sei como te falar sem que através das mãos na tua nuca quando me beijas
no vórtice de silêncio que me dá voz estão contidos todos os intransigentes pactos que por juramento ao corpo prometi não quebrar
e tu olhas, observas taciturno os gestos
(enquanto eu perco horas a memorizar os jeitos)
e analisas, examinas cada passo e movimento
(e eu a perseguir cada rasto que deixas em mim para saciar reminiscências)
somos desconformes e discrepantes no modo como dizemos amor sem utilizar palavras
eu sinto-me indomável e intrépida de alma
mas quando tento que todo o resto de mim to mostre... tudo parece entorpecer e cair num estado de letargia
e então não sei como te dizer
não sei como te mostrar
que tudo em mim te procura
não sei como me fazer sentir com algo transcendente ao meu sublime interior
não sei como me fazer ouvir com algo dissímil da já invulgar forma como te falo
e deixo-me cair
e cair, cair
deixo-me afundar e mergulhar em ti
sempre aos poucos
sempre à espera
que em mim imerjas
que em mim te embrenhes
que em mim te dissolvas tão coesamente
que em mim te craves tão afincadamente
a tal estado
que de mim tudo o que sobre
seja em ti tudo o que faltar
e em ti tudo o que reste
seja o que em mim sempre escasseia
quando vais e o teu absentismo provoca um intenso e profundo sentimento de vazio,
e quando te procuro com cem ideias, (com a pureza, o sol, o fruto, a criança, a água, o deus, o leite, a mãe, o amor)
sem nunca te saber dizer como
(em correlação com o poema Tríptico, de Herberto Helder)