segunda-feira, 28 de março de 2016

just take a look inside, into these eyes that burn, come to these arms that yearn

arrefeço na doença de te inalar o corpo
o teu suor a depositar-se na roupa da cama
na pisadura que o peso das minhas virilhas nos teus ossos faz

tropeço nos gemidos interrompidos pela luz da rua
nos teus dedos a sentirem-me a língua arder
na garrafa cheia do vazio que vomito sempre que te deixo na cama

queimo-me pelo frio das peças de roupa que começam a decorar o chão do quarto quando tenho de as voltar a pôr
abandono-me pelas calçadas onde descalça calcei os teus pés com os lábios e neles me cortei com os vidros que havias pisado antes
rastejei pelo teu corpo à procura de refúgio na pele que com os dedos me fez parar a circulação e que com as mãos reanimou a razão que em mim almeja pelo sufoco


os insetos que se acumulam em volta dos candeeiros lá de fora perguntam-me por que durmo de luzes acesas e persianas fechadas. as folhas das árvores no chão não entendem por que fico a ver o sol incendiar a linha do horizonte sem lhe conseguir pegar fogo. o cimento dos muros e o asfalto da estrada observam a minha melancólica rotina de despir as calças, a camisola, o sutiã e a alma e não perguntam, mas questionam-se acerca da minha pressa em logo me cobrir de outros panos.

àquilo que as coisas me perguntam sem falar, eu respondo sem ver que nua só durmo no único escuro que não me faz ver preto, que água só bebo aquela que me enche de sede. grito a tudo o que não ouve que só sei nadar em aquário, que ar é asfixia, que néon é o preto e branco do sublime, que o silêncio tem vários acordes, e que o meu sangue só circula quando o meu coração pára.

atiro-me pelas ondas do medo e contra a corrente mergulho nos minutos efémeros de sentir que existo. quando a voz me chega às mãos só consigo falar com o corpo e olho para ti para reconhecer o meu dialeto.



segunda-feira, 21 de março de 2016

please, please, please

já te tenho em mim, absorvido pelos poros
através do beijo que me depositaste na nádega quando te debruçaste sobre mim
sob a forma dos teus dedos dentro da minha boca, dos meus dentes a pressionar os teus ossos

tenho-te na madrugada quando durmo nua a teu lado e do outro lado dos lençóis o frio corta
com os lábios a calcar a pele e as mãos a marcá-la
com a carne a salgar a língua e o corpo a chamá-la

tenho-te na manhã já iluminada quando finalmente fecho os olhos e adormeço, quando os abro e não te vejo, quando chegas e não estás, quando partes e não vais.
tenho-te nas palavras que não dizemos, nos beijos que engolimos em seco por orgulho ou medo, no toque que se retrai quando mais dele precisamos, na vontade insaciável que aos poucos nos aumenta a sede.

tenho-te em tudo o que não vejo, no desejo e ânsia, no sublime da existência.

numa cama
dentro de mim
a recriar-me
reinventar-me
reviver-me
pertencer-te





domingo, 13 de março de 2016

the love you (don't) feel when you're holding me

só me amas quando me embriagas com sono e violência. a tua força diz-me sempre quando me queres. a noite ressoa os vidros da tua janela e o teu corpo aquece-me quando me encaixas em ti como se eu não me ajustasse em mais lado nenhum e me agarras por dentro da roupa. só quando me beijas é que sinto ter permissão para me entregar a ti como quero sempre. permites que te beije os ombros, te passe a mão pela nuca lentamente, posso deitar a cabeça no teu peito e sussurrar-te ao ouvido. apertas-me nos teus braços e eu deixo de me sentir vazia. quero ficar dentro do teu abraço e não deixar que amanheça dentro do teu quarto. adormeces-me enquanto me beijas a testa e eu encosto os lábios ao teu pescoço e penso na efemeridade daquele momento. quando me mexo sinto-te agarrar-me mais, dizes que não me deixas ir, mas eu acabo por sair de ti. e é quando te beijo a testa que sei que vou ter de viver novamente das memórias destes encontros fugazes na escuridão, com os meus dedos por entre os teus cabelos, quando te digo que descanses e que vou embora, começo a tentar encarar a realidade de não te ter por inteiro. fecho a porta atrás de mim e os olhos à frente, respiro o ar da manhã e conto os dias e dias que passam até que anoiteça outra vez.



domingo, 6 de março de 2016

temptation

todas as superfícies me pedem que deixe a minha anca sentir o frio da pedra
a minha voz passa a falar com volume e rouquidão de súplica

fode-me

olhar para ti pelo canto dos olhos e passar a língua pelos cantos da boca

dá-me de beber

os meus dedos a querer percorrer-te o peito e agarrar-te pulsante e ansioso

vem-te em mim



hoje fiquei a ver-me refletida no vidro preto enquanto chupava guloseimas, a minha língua a entrelaçar, recuar, doce e vermelha. os meus lábios a moldarem-se e sugar o açúcar, sedentos e rasgados.
quis que estivesses do outro lado, que partisses os vidros, me agarrasses pelos cabelos enquanto eu cortava os joelhos nos cristais do chão, com as minhas unhas a agarrarem-te pelas coxas, a minha boca a substituir o doce pelo salgado.

ontem adormeci a sentir-te atirar-me contra a parede, a apertar-me o pescoço enquanto me sussurravas ao ouvido que me querias espancar, a puxar-me com a mão esquerda para cada vez mais dentro de ti. eu gemia como resposta, e sorria em provocação, pedia com os olhos que me deixasses nódoas negras em todos os sítios por onde querias passar com a boca, que marcasses com os dentes todos os pedaços de mim que te parecessem demasiado puros.





quinta-feira, 3 de março de 2016

antídoto

quando esta água que nos corrói a pele aos poucos e nos leva as camadas outrora decoradas por lábios alheios nos afunda e entra pela minha boca em bolhas incessantes, eu fecho os olhos e ouço a música embaciada pelas paredes. em cima de mim apenas um teto branco e húmido, e eu sentada neste banco de inox deixo que a minha nuca recoste. os poros estão abertos e a água embala-me deixando dentro das minhas pálpebras apenas uma visão quimérica que por alguns eternos segundos chega a ser real. nas gotas que me molham os lábios a tua língua toma lugar e no toque ocasional que resulta de um roçar temido e contido do meu tornozelo nas tuas coxas agarras-me com os teus dedos grossos e massajas-me os músculos. só nos meus cabelos molhados repousa uma réstia de sanidade que se solta contra as ondas forçadas e se molda ao meu desejo inocente de concretização. olho para ti depois de abrir os olhos e o cloro que nas minhas pestanas se instala escorre até ao interior da minha boca. saboreio cada lágrima ádvena como a saliva do teu palato, desvio o olhar para a luz que na água quente se tonaliza de azul néon, solto um suspiro de permanente desejo, inconsequente busca, eterna insatisfação.

tenho medo de soltar a mão do ferro metalizado à qual a fundi, medo de cair na água sobre a qual flutuo, afogar-me se deixar o corpo chegar à superfície. o meu pescoço exterioriza o ritmo da minha pulsação amenizada, mergulho pelo ar acima e sufoco com o oxigénio que te alimenta, com a concentração de pureza que lhe falta. a atmosfera pesa com todo o silêncio que lançamos com a nossa respiração ofegantemente controlada, a gravidade empurra-me para cima e não te arrasta para mim, a voz com que me falas soa a desconhecido e só o meu corpo consegue transpor a fronteira entre nós, na minha pele escamosa a tua boca é alga venenosa. o teu veneno é cura. a cura é ar. o ar é não respirar.