há um poema acerca de idas ao casino e passar noites em quartos de hotel que ficou por escrever
- como perdemos dinheiro por entre sons estridentes
e como manchei de água os lençóis luxuosos com os meus cabelos encharcados -
entretanto cresceu em mim um novo motivo
- a tua pele de seda em contacto com a minha face
e como te inspirei e sustive a respiração até me sentir a sufocar -
e no entanto custa-me escrever um poema
- dói-me tanto, tanto,
corrói-me por dentro -
já não tenho palavras para descrever o que vai sucedendo
- já não sei como dizer que me aconteces sempre de forma diferente
sem que o diga da mesma maneira que sempre disse -
os meus poemas tornaram-se raízes mortas
- que regas sempre com o teu toque,
mas que acabam por nunca sair da minha terra -
e com todo o esforço que faço para que brotem
- guardando delicadamente todas as palavras mais especiais
(aroma, sauna, nódoa negra, espelho) -
só os enterro mais em mim
- onde o sol nunca chega,
e contudo o solo seca -
de todas as vezes que te toco escrevo um verso
daí nunca querer tirar as mãos das linhas que sobressaem nos teus braços
às vezes penso em abdicar das palavras
e talvez seja por isso que elas já me descartaram há muito
e penso em como poderia continuar a semear-me em ti
- sem demoras, sem tensões, sem esforço -
talvez a hera que há em mim pegasse no teu corpo
e me fizesse subir ao estatuto que me tornaria Hera de ti
de cada vez que te toco escrevo um verso
e há mil versos em mim por escrever
às vezes só desejava que fosses uma folha
e toda a tinta do mundo não seria suficiente