abrisses os braços para mim
tomasses na tua pele o meu sabor afagado
beijasses com os dedos o meu corpo molhado
esperava que surgisses como um osso de luz reconhecível
mesmo durante a noite esperei
por um clarão acalentado que me queimasse a alma
uma pele de água que me hidratasse por dentro
e tu nunca vieste
mais nada me poderia acontecer
todos os versos que eu queria escrever no teu corpo ficaram sem papel
e na minha língua a tinta secou numa rapidez cruel e pungente
teu rosto chegava-me à memória como mancha de fumo
longínqua nódoa de água e sangue
uma mancha de suor e lágrimas,
uma nódoa de vapor que inalei inabalavelmente
nos pulsos
uma mancha e tu não chegaste
quando tudo aquilo que a minha voz formulava eram as letras do teu nome
não chegaste depois de eu gritar com todo o ar dos meus pulmões que te esperava
desculpa
o que queria dizer talvez não fosse isto
não te culpo pelas horas demoradas enquanto uma tempestade rompia lá fora
nem sou capaz de te dizer incapaz de mim
a solidão turva-se-me de lágrimas
e nas pálpebras tremem visões do meu delírio
do nosso futuro condenado pelas alucinações do teu passado
e eu, sempre sozinha, à espera de ti
olho as fotografias de antigos desertos
corpos coerentes que fomos
e não te vejo nelas, como se a memória apenas me pertencesse a mim
e como se eu ficasse com o fardo de todo o seu peso por querer aguentá-la tão profundamente dentro de tudo o que aconteceu
onde a sede nunca encontrou a sua água
onde me disse capaz de te beber, salgado e puro,
capaz de te absorver, sápido e impotável,
e diluir no meu sangue tudo o que de ti ficou por provar
é que às vezes ainda te sinto mergulhar e nadar em mim
e às vezes ainda tenho sede de ti
(itálicos de um poema de Al Berto)
Dançaste nua com as palavras do poeta e a pele da tua memória destilada pelas tuas palavras inebria de forma absolutamente marcante. Sublime... Tu.
ResponderEliminar